30 outubro 2006

Um show de guitarra

John Mayall foi, não só, o grande divulgador dos blues na Grã-Bretanha, mas também o líder de uma banda que foi ponto de partida para a fama de músicos como Eric Clapton ou Mick Taylor. Esta é uma das suas principas habilidades e dela fala numa entrevista que está incluida no DVD que regista o concerto de comemoração dos 70 anos de um homem que é uma lenda viva. Rodeado por estes antigos companheiros e contado, ainda, com as colaborações do trombonista Chris Barber e de um soberbo guitarrista que integra os Bluesbreakers, Buddy Whitington, Mayall tem aqui uma festa de aniversário à altura. Melhor do que isso, é o facto de o evento ter sido filmado, testemunhando que há gente, como o homenageado, que mantém intocados os seus talentos apesar da inevitável passagem do tempo. Neste fenomenal concerto, aquilo a que de mais impressionante se pode assistir é um show de guitarra, protagonizado por Clapton, Taylor e Whitington. É de ver, ouvir e chorar por mais.

29 outubro 2006

Eu ontem adormeci assim

Escolher a música que se ouve é, por vezes, um acto que surge numa cadeia de decisões relacionadas entre si. Salta-se de um disco para outro, a propósito daquilo que acabou de se ouvir. A partir da referência anterior a Chan Marshall fui parar a uma outra voz feminina que está registada entre as minhas favoritas. Não tanto pelo que fez enquanto Mazzy Star, mas pelo primeiro álbum, e único até agora, como Hope Sandoval & The Warm Inventions. Bavarian Fruit Bread é um disco sereno, daqueles que estão bem talhados para remate de um dia, quando a energia já não chega para consumir mais um capítulo do livro que se está a ler, mas é ainda suficiente para se colocarem os auscultadores e vaguear para onde a música nos quiser levar. Eu ontem adormeci assim e adormeci bem. Com a voz de Sandoval a embalar o meu primeiro sono.

28 outubro 2006

Satisfação garantida

Já que estamos numa onda (curta) de álbuns de versões, justifica-se regressar a Cat Power, ou a Chan Marshall. Em 2000, foi lançado The Covers Record, cujo título é inequívoco quanto àquilo de que se trata. Marshall surge neste disco no papel de one woman band, exceptuando em Salty Dog, quando a guitarra de Matt Sweeney aparece para dar uma ajuda. Entre as 12 canções que foram escolhidas para figurar no disco, encontram-se temas de Lou Reed e de Bob Dylan. Mas é logo no arranque deste álbum que se encontra o grande motivo para o conhecer. Voz e guitarra acústica são os meios frugais mas suficientes para Chan Marshall interpretar uma versão memorável de (I Can't Get No) Satisfaction, o velho hino dos Rolling Stones, a que é inteligentemente suprimido o refrão. Pegar numa canção que já terá conhecico centenas de variações, conseguir dar-lhe a volta e refrescá-la é obra.

27 outubro 2006

Leonard Cohen revisitado

Tenho lido por aí que há um novo disco de homenagem a Leonard Cohen e que, se não estou em erro, é a banda sonora de um documentário sobre este ímpar compositor de canções e poeta. Ainda não ouvi nada desta nova gravação, mas dizem-me que a anterior colectânea de versões de muitos dos seus mais celebrados temas, I'm Your Fan, de 1991, é superior. Não estou em posição para fazer comparações, mas posso revelar que este disco me foi fiel durante muito tempo após o ter adquirido. Entre nomes à época já consagrados, outros que estavam a caminho do auge e, ainda, alguns que conheceram uma fama fugaz, I'm Your Fan é um belíssimo disco, à altura daquilo que o homenageado merece. Para quê fazer nova tentativa se, a avaliar pelo que diz, não foi para fazer melhor?

25 outubro 2006

O pano e a nódoa

Já escutei pedaços da nova gravação do Esbjörn Svensson Trio e posso dizer que o disco não me agradou. Não tenho aquele género de preconceitos puristas que levam alguns apreciadores de jazz a rejeitar o que quer que seja que saia das estritas margens deste género musical. Acho, mesmo, que esta é uma atitude que tem pouco a ver com a liberdade e a capacidade de absorção de novas influências que tem justificado a enorme vitalidade do jazz ao longo praticamente de cem anos de vida. Em relação a Esbjörn Svensson, acho que é um pianista dotado. A sua aproximação ao rock, se torna a sua música mais acessível e "comercial", também não deixa de ser uma experiência com bons resultados. Não tanto no seu álbum mais recente, mas através de outros discos como Seven Days of Falling. Quando a nódoa cai no pano, nem por isso este deixa de ser o que era.

24 outubro 2006

Frisell e o essencial

Há guitarristas que, com o passar do tempo, foram consolidando as suas capacidades técnicas. Superaram barreiras, para fazer solos cada vez mais rápidos e impressionarem as audiências com números "impossíveis". Não é o caso de Bill Frisell. De gravação, em gravação, foi-se despojando do que considerou ser acessório, concentrando-se em apurar uma sonoridade única e facilmente identificável. No entanto, cada vez mais simples, na sua aparência. Pode avaliar-se esta situação em várias das suas obras mais recentes. East/West é um desses casos. Gravado em trio, com baixo e bateria a acompanhar a guitarra e os loops de Frisell, o disco passa em revista alguns standards do jazz. Mas, também, temas de Bob Dylan, Johnny Cash ou Willie Nelson, nomes grandes da música popular norte-americana, em cujas águas Frisell tem ido buscar muita da sua inspiração.

23 outubro 2006

Kasper Villaume e os standards

Então, aqui vai mais um pianista digno de nota. Trata-se de Kasper Villaume, um nome que, para mim, permaneceu na sombra até ao dia em que adquiri aquele que julgo ser o seu mais recente álbum editado até à data. Mas não é esse o disco que justifica esta referência. Foi o anterior, 177 Ditmas Avenue, gravado em trio, que passou hoje pelo leitor de CD. Inclui clássicos como Caravan, I Fall in Love Too Easily, Long Ago and Far Away e Seven Steps to Heaven. Tudo isto, e mais cinco faixas, é tocado de forma impecável e com muita dedicação. De tal maneira que uma pessoa até se esquece que já escutou dezenas de versões de alguns daqueles standards, ao ponto de desconfiar de cada vez que surge mais alguém no mercado a tentar fazer algo de diferente a partir de algumas velhas melodias.

22 outubro 2006

Marsalis e a lenda

Em pouco mais de 20 anos de gravações sob a sua liderança, Branford Marsalis já assinou uma mão cheia de discos de qualidade superior. Os álbuns mais recentes revelam um saxofonista em plena maturidade, capaz de se rodear de companhia à altura dos seus padrões. O novo registo segue nesta linha e como já li algures John Coltrane é, cada vez mais, uma referência no trabalho deste músico, ele próprio, por sua vez, uma referência obrigatória do jazz nos dias que correm. No tema de abertura de Braggtown, Jack Baker, o arranque para o solo ilustra bem esta situação, com frases rápidas e entrecortadas muito "coltranianas". Também em Hope, o desempenho de Marsalis no sax soprano evoca os tempos em que foi construida uma das maiores lendas de sempre neste instrumento. O mais velho dos irmãos Marsalis está em grande forma e o seu quarteto é um exemplo de consistência.

21 outubro 2006

Perfeição

Aqui pelas bandas, o dia está cinzento escuro e chuvoso. Não é caso para admirações. O serviço de meteorologia lançou um "alerta amarelo". Prevê-se chuva e ventos fortes em todo o país até à próxima segunda-feira. Ao contrário do que sucedeu em anos anteriores, o Outono promete água e saudades de uns raios de sol. Este tempo tem o seu encanto. Fica-se em casa e aproveita-se para fazer algumas actividades adiadas. Arrumar os livros e os discos, por exemplo. Com uma banda sonora a condizer, "está-se bem". Fui resgatar The Real McCoy, de McCoy Tyner, à prateleira e coloquei a tocar o segundo tema do álbum, Contemplation. Sabe bem ficar em casa nestes fins-de-semana. Com a música adequada, até podem ser perfeitos.

20 outubro 2006

Anti-heróis

Há dias em que uma pessoa acorda com uma música na cabeça. Hoje, enquanto me preparava para mais um dia de trabalho, dei por mim a escutar No More Heroes, dos Stranglers, como se a canção estivesse a tocar dentro do meu próprio cérebro. De entre as bandas que emergiram após a queda do rock progressivo e a explosão do punk, os Stranglers são um dos projectos que merecem mais atenção. Quando tiveram a sua oportunidade já não eram uns instrumentistas toscos em busca da energia primordial, mas também queriam dar o grito de libertação em relação ao beco em que o rock havia entrado. Viram uma porta aberta e deram o salto para o desconhecido, juntando bateria, baixo e guitarra, a essência do punk, com sintetizadores, a essência das bandas de prog-rock. Há muitos outros temas que resumem bem o que de novo os Stranglers trouxeram ao rock. Mas No More Heroes inclui praticamente tudo.

19 outubro 2006

Like a (rock &) Rolling Stone

Não sei se foi por preguiça, cansaço ou as duas coisas em simultâneo. Mas acho que os Rolling Stones podiam ter feito bastante melhor quando gravaram o álbum Stripped. Considero a escolha dos temas do disco muito questionáveis. Com uma colecção de canções tão vasta como a que a banda já acumulou, parece-me que há pelo menos uma dúzia de temas que poderiam ter sido gravados em versões semi-unplugged e que substituiriam com vantagem alguns dos que figuram neste álbum. Tumbling Dice ou Brown Sugar seriam desafios bem mais interessantes do que Angie ou Wild Horses que não ganharam grande coisa em relação aos originais. Ainda assim, há alguns bons argumentos para classificar com nota positiva esta edição dos Stones. No topo, coloco a excelente versão de Like a Rolling Stone, de Bob Dylan. Respeita quanto baste o original no que toca aos arranjos, mas acrescenta-lhe os traços roqueiros que fazem parte do carisma da banda. É uma canção a que recorro com regularidade para limpar a poeira da vida diária.

18 outubro 2006

Uma questão de justiça

Hoje, estou de parabéns. Resisti ao impulso consumista. Passeei durante uma hora e meia numa loja cheia de discos, escutei talvez uns dez ou 15 e, no final, apresentei-me na caixa apenas com um que, para já, não quero revelar. De regresso a casa, também resisti à tentação de colocar o CD adquirido a tocar no leitor do carro, em beneficio do que já lá estava. E que CD era? Who's Next, um dos álbuns históricos dos The Who, que foi parar ao carro por um motivo muito simples: o tema Baba O'Rilley serve de genérico na série CSI, Nova Iorque. Não sigo este sucesso de audiências, mas, num destes dias, vi um episódio e, no final, aquela canção ficou a fazer-me comichão na orelha. É um álbum cheio de acordes abertos, energia e entrega, como os The Who protagonizaram nos seus melhores tempos. Se há obras-primas no rock, Who's Next terá de figurar nos primeiros lugares. Caso contrário, não haverá justiça no mundo.

17 outubro 2006

Eu ontem adormeci assim

O que não falta actualmente na pop são vozes femininas. A diversidade é grande e o difícil é escolher. Cat Power, aliás, Chan Marshall é uma das opções mais interessantes. Com o tempo, a sua escrita tem vindo a ganhar sofisticação e as canções tornaram-se mais macias, mas sem perderem o contacto com um lado sombrio que também marca a sua música. You Are Free está em linha com esta evolução. Tem guitarras acústicas e eléctricas em doses frugais, um piano solitário num ou noutro tema e, por cima de tudo isto, a belíssima voz de Marshall. Para desfrutar de preferência na solidão de um iPod.

16 outubro 2006

Emoções intactas

Andava há algum tempo para comprar este disco. Na oportunidade mais recente, decidi finalmente levá-lo para casa. Tem a curiosidade de se tratar do primeiro registo de Muddy Waters mas, mais importante do que isso, transformou-se numa obra incontornável de blues. Os motivos são bem evidentes. Há uma vitalidade contagiante nesta música gravada durante o festival de Newport, em 1960. Escute-se I Got my Brand on You, Tiger in Your Tank ou I've Got my Mojo Working e será difícil resistir ao apelo das canções, interpretadas com um sincero empenhamento. É possível perceber, pela gravação, que a audiência deste concerto teve direito a cerca de meia hora de intenso gozo. Melhor ainda: a capacidade deste disco para provocar emoções fortes permanece intacta, mais de quarenta anos depois da sua edição.

15 outubro 2006

A tradição ainda é o que era

Faço surtidas frequentes às lojas de discos em busca de tudo e de nada em especial. Nos estabelecimentos com existência física ou nos virtuais, um dos gozos deste passatempo está na descoberta de novidades, no sentido de álbuns e músicos que nunca escutei, mas que podem não ser propriamente obras e autores acabados de surgir. Numa surtida aos escaparates onde figuram os discos de blues, decidi pegar em Atom Bomb, dos Blind Boys of Alabama. Aqui está um grupo vocal do qual não se pode dizer que seja novo no negócio, pelo simples facto de que foi fundado nos finais dos anos 30 do século passado. Sobre a música, também não se pode dizer que seja inovadora. Mas também não era essa a expectativa. O álbum é uma revigorante mistura de blues e gospel, bem cantado e dotado de uma sólida base instrumental, onde cabem figuras tão experientes como o organista Billy Preston, cuja prestação na versão de Presence of the Lord tem um sabor genuíno a bons e velhos tempos. A tradição ainda é o que era.

14 outubro 2006

1+1=1+1

Numa busca na Internet descobri, casualmente, que Pat Metheny e Brad Mehldau tinham acabado de editar um CD. Nunca me passou pela cabeça que tal dupla algum dia se fosse juntar para gravar um disco. Mas não me pareceu que o projecto fosse destituído de sentido. A junção, em estúdio ou ao vivo, de dois músicos excepcionais tem fortes probabilidades de resultar num rotundo fracasso ou num enorme sucesso. Em ambos os casos, fica garantida uma impressão duradoura, por bons ou maus motivos. Gosto dos dois músicos. Enfim, gosto mais do pianista que do guitarrista. Metheny mantém alguma capacidade para surpreender, mas tende a repetir-se a si próprio com demasiada frequência. Neste caso, acho que a frescura de Mehldau acaba por se conjugar bem com a personalidade vincada de Metheny. Tratando-se de dois músicos com um elevado foco na melodia, a música deste álbum resulta praticamente perfeita. Nenhum se sobrepõe, cada um respeita o espaço do outro. E eis como a soma de duas partes igualmente afirmativas pode produzir um resultado harmonioso.

13 outubro 2006

Elton "Levon" John

No suplemento Y do Público de hoje, há um texto sobre Elton John, a propósito do lançamento do novo álbum, Captain and the Kid. Há muito tempo que a música desta vedeta da pop não me suscita qualquer curiosidade. Mas decidi ler o texto, atraído pelas imagens das capas de quatro álbuns dos anos 70. Não fiquei convencido sobre o interesse do novo disco, mas subscrevo uma boa parte do que se afirma sobre a carreira de Elton John, sobretudo quando se sublinha que, ao contrário daquilo que é ditado pelos preconceitos, houve uma época em que esta figura extravagante criou grandes canções - eu diria, até, merecedoras da eternidade. Um dos excelentes álbuns dessa fase é Madman Across the Water, de 1971. Inclui, pelo menos, dois temas de que nunca me cansarei, a saber: Tiny Dancer, o hit-single retirado deste disco, e Levon, raramente citado quando se fala dos "melhores momentos" de Elton John, mas que é uma canção arrebatadora.

12 outubro 2006

Mestre Miles

Já que falamos de mestres, aqui fica, também, uma referência a Miles Davis. Sou um entusiasta do seu primeiro quinteto histórico, não gosto de tudo o que fez o segundo - quando Miles se ligou à electricidade e fez a fusão entre jazz e rock - e, por fim, tenho muitas reservas em relação àquilo que produziu já na derradeira fase da sua carreira. Mas entre o que, neste período, fez nas gravações de estúdio e o que evidenciou ao vivo, há diferenças de relevo. We Want Miles é um bom exemplo. É uma das gravações que marca o regresso do trompetista à actividade, depois de uma interrupção que coincidiu com a segunda metade dos anos 70, e mostra-o de volta à boa forma. Jean-Pierre, com a sua melodia simples e amiga do ouvido, é um dos momentos incontornáveis, a par de Back Seat Betty e My Man's Gone Now. Embora não se inclua entre os grandes "clássicos" gravados sob a sua liderança, We Want Miles merece um lugar especial na discografia do trompetista.

11 outubro 2006

Mestre Coltrane

Num artigo da revista The Economist, a propósito do edição do livro The House That Trane Built: The Story of Impulse Records, recorda-se uma velha história. Intrigado com a extensa duração dos solos de saxofone de John Coltrane, Miles Davis perguntou-lhe, um dia, a que se devia esse facto. Coltrane respondeu, simplesmente, que não sabia como terminar. Lacónico e pragmático, o trompestista emitiu o seu conselho sábio: "experimenta tirar o sax da boca". Antes de seguirem diferentes trilhos, os dois músicos integraram o brilhante quinteto liderado por Miles durante parte dos anos 50. Depois, John Coltrane formou o quarteto que, na década seguinte, iria deixar uma marca indelével na história do jazz. Entre tudo o que de fenomenal o saxofonista gravou, nesse período, para a etiqueta Impulse, não é fácil, nem aconselhável, fazer escolhas. Ainda assim, aqui fica o registo de uma das minhas peças favoritas, a versão integral dos concertos de 1961 no Village Vanguard, em Nova Iorque, que aqui há uns anos, e em boa hora, me foi oferecida. É uma bela caixa com quatro discos de música intensa e empolgante.

10 outubro 2006

Eu ontem adormeci assim

O meu primeiro contacto com Rattlesnakes não teve nada de especialmente assinalável. Tal como milhares de outros futuros admiradores de Lloyd Cole and The Commotions, escutei Perfect Skin num qualquer programa radiofónico e aderi de imediato. O segundo tema que escutei do álbum terá sido Charlotte Street. Ou, talvez, Are You Ready to be Heartbroken?. Não me recordo. Sei que estas canções, bem como 2cv, Four Flights Up, Down on Mission Street e, claro, a faixa que dava título ao álbum, justificaram sucessivas audições do LP, até os ruídos provocados pela electricidade estática, agora tão apreciados, terem começado a interferir na audição. Também em certa ocasião apanhei na rádio Andy's Babies, canção que não constava do alinhamento original mas que figura agora no CD. Embalado pelo mais recente lançamento de Lloyd Cole, foi um prazer reescutar estas velhas preciosidades.

09 outubro 2006

Dois em um

E por falar em pianistas, hoje fiz o percurso entre casa e o local de trabalho na companhia de outro feiticeiro das teclas. Trata-se de Brad Mehldau e da sua mais recente edição, House on Hill. Os temas que integram este álbum foram gravados na mesma sessão de que resultou a edição de Anything Goes. Mas enquanto neste disco Mehldau gravou as suas versões de temas compostos por terceiros, em House on Hill toda a música que se pode escutar é fruto da imaginação do pianista. Aqui, como já anteriormente tinha sucedido em Places, estamos perante um disco que é uma espécie de dois em um, juntando o impecável executante com o talentoso compositor que co-habitam em Brad Mehldau. Junte-se o facto de o pianista estar acompanhado de Larry Grenadier e Jorge Rossy, parceiros de longa data, e fica completo o retrato de mais uma peça brilhante no percurso de Mehldau.

08 outubro 2006

Um verdadeiro artista

Tenho uma especial predilecção por pianistas de jazz e Jason Moran está entre os que mais aprecio. É um dos valores seguros de uma nova geração e um dos segredos deste músico está na busca, disco após disco, de caminhos novos através das suas próprias composições. Artist in Residence é a mais recente gravação, tendo por base um quarteto que, além de Moran, inclui Marvin Sewell, na guitarra, Tarus Mateen, no baixo, e Nasheet Waits, na bateria. É um album notável e, após uma primeira audição, ficaram-me no ouvido sobretudo dois temas: Refraction 1 e He Puts on His Coat and Leaves. Eis uma obra que vai passar com regularidade pelo meu leitor de CD durante os próximos tempos.

07 outubro 2006

Lloyd Cole está de volta

Nunca entendi por que razão Lloyd Cole sempre foi tão subestimado no seu mercado natural. A popularidade em países como Portugal talvez tenham servido de compensação para alguém que merecia um registo menos modesto entre o que de bom se fez na pop desde os anos 80 para cá. Também não tenho grande moral para falar. Desliguei-me da obra de Cole há muitos anos. Espicaçado por uma crítica favorável, publicada no Diário de Notícias, decidi escutar o novo Antidepressant. Descobri que tinha saudades deste mago. Gosto deste mais recente álbum, a começar pelo título. Recomendo-o e, ainda mais importante, vou hoje mesmo resgatar do baú os velhos discos gravados com os Commotions.

06 outubro 2006

Experiência serena

Marc Johnson é um experiente contrabaixista, com uma carreira que já vai na quarta década de percurso. Tocou no derradeiro trio do pianista Bill Evans, o que constitui um importante cartão de visita. Mas, nas gravações que liderou, apenas nove até agora, nem tudo foi particularmente interessante. Não é esse o caso de Shades of Jade, disco sobre o qual já se disse ter todos os ingredientes para vir a transformar-se num clássico. Não sei se não haverá aqui algum exagero, mas já me parece indiscutível que se trata de um óptimo álbum, cheio de música serena, interpretada por uma banda sólida e competente.

05 outubro 2006

It's only knock and knowall but I like it

Este é o derradeiro verso cantado por Peter Gabriel no tema It, que encerra o álbum The Lamb Lies Down on Broadway. Ontem, sob um ataque cerrado de nostalgia, decidi fazer a audição integral desta obra-prima do rock progressivo. Na altura do seu lançamento, em 1974, os Genesis chegavam aos píncaros da sua capacidade criativa e foi nesse momento que o líder carismático da banda decidiu arrancar para uma carreira a solo, colocando praticamente um ponto final num dos projectos mais originais e apaixonantes na música que se fez durante a primeira metade dos anos 70. Teria sido possível aos Genesis, com Peter Gabriel, terem ido ainda mais longe depois deste duplo-álbum? Nunca o saberemos, o que acrescenta ainda maior interesse no regresso a este registo. It's only knock and knowall, but I like it (very much).

04 outubro 2006

O Clapton que interessa

Sou daqueles apreciadores de Eric Clapton que lamenta muito daquilo que o guitarrista andou a fazer durante as décadas de 70, 80 e 90. Álbuns consecutivos lançados pelo antigo membro dos Cream revelaram a opção por música desinteressante e frequentemente enjoativa, num desperdício quase criminoso dos seus elevados méritos como instrumentista. Esta situação torna-se ainda mais flagrante de cada vez que Clapton decide regressar aos blues e, portanto, àquilo que sabe fazer realmente bem. O disco de homenagem a Robert Johnson, Me and Mr. Johnson, é um desses casos. Não consegue fazer esquecer o resto, mas ajuda à reconciliação.

03 outubro 2006

Alto Son

Son é o quarto álbum de Juana Molina, autora e cantora oriunda da Argentina. Foi uma das minhas companhias favoritas durante as férias de Verão. Com a sua pronúncia cerrada, uma voz preguiçosa e uma dúzia de canções apoiadas na guitarra acústica e nuns salpicos bem doseados de electrónica, Molina fez um disco que intriga e hipnotiza ao primeiro contacto. Para quem começou por ganhar fama como actriz de comédia, não deixa de ser uma surpresa. E, também, um estímulo para conhecer os trabalhos anteriores.

02 outubro 2006

Reunião de veteranos

Bill Frisell, Ron Carter e Paul Motion pertencem a diferentes gerações do jazz, mas todos têm já experiência suficiente para poderem ser considerados veteranos. Enquanto o guitarrista começou a liderar sessões de gravação nos anos 80, o contrabaixista já o fazia no início da década de 60 e o baterista a partir de 1972. Neste disco, o som distinto e facilmente reconhecível de Frisell, junta-se à profundidade do contrabaixo de Carter e à elegância de Motion na bateria. Os três músicos complementam-se na perfeição para fazerem um dos discos de jazz mais agradáveis dos últimos tempos.

01 outubro 2006

O disco que faltava

Finalmente, o álbum-duplo com gravações ao vivo dos Talking Heads, originariamente lançado em 1982, conheceu uma versão em CD. The Name of this Band is Talking Heads, na nova versão, traz nada menos do que 33 temas, 19 relativos à fase inicial da banda, entre 1977 e 1979, e os restantes registados durante a digressão que promoveu Remain in Light, já no início dos anos 80. A música de David Byrne e companhia, uma das mais fortes pedradas no charco do período pós-punk, surge aqui com uma notável pujança e há temas que superam as próprias versões originais. Estamos perante um melhor testemunho dos talentos dos Talking Heads quando tocavam ao vivo em comparação com Stop Making Sense, lançado dois anos mais tarde? Eu diria que sim.