24 fevereiro 2007

Miles e os novos territórios

Estaria a mentir se dissesse que a fase eléctrica de Miles Davis é a que mais aprecio em toda a sua carreira. Tenho uma especial predilecção pelo fabuloso quinteto dos anos 50 mas é evidente que esta circunstância não me impede de retirar grande gozo da audição dos discos em que Miles Davis, sempre à frente das tendências, fez a fusão entre o jazz, o rock e o funky, entre o final dos anos 60 e o arranque da década seguinte. Aliás, se alimentasse alguma resistência, discos como A Tribute to Jack Johnson certamente seriam capazes de a amolecer e tal atitude seria completamente inútil depois de ter a oportunidade de escutar os seis discos que integram The Cellar Door Sessions 1970, uma compilação de gravações efectuadas naquele clube de jazz que, lançada numa luxuosa caixa em 2005, veio presentear os admiradores do visionário trompetista com actuações inéditas. Levei algum tempo a deglutir as largas horas de música porporcionadas por esta iniciativa, mas acabei por dar o meu tempo por bem empregue. Miles é acompanhado por músicos ilustres como Keith Jarrett, Gary Bartz, Jack DeJonhette e John McLaughlin, em improvisos que vão desafiando e derrubando quaisquer fronteiras entre estilos, apoiados em tempos fortes e bem acentuados, como os que uma banda de rock ou de funky não desdenharia. The Cellar Door Sessions dá testemunho do trabalho de músicos sempre em busca de novos territórios, chefiados por um dos mais aventurosos que o jazz já conheceu.