31 dezembro 2006

Concorrência desleal?

À medida que o tempo vai passando, festejar a chegada de um novo ano é algo que me deixa cada vez menos entusiasmado. Não se trata de um caso de pessimismo militante. Faço parte daquele grupo de pessoas, que julgo bastante vasto, que não aprecia particularmente as datas em que é obrigatório estar bem disposto e confiante no futuro. Mas, enfim, festa é festa. E para contornar as dores musculares que o recurso prolongado aos sorrisos forçados pode provocar, há que arranjar tácticas que transformem o sacrifício num prazer. A pensar no serão de hoje, em vez de optar por um bolo-rei ou uma garrafa de espumante, decidi deslocar-me a um estabelecimento da especialidade com o objectivo de trazer para casa o DVD duplo que contém os dois concertos de Steve Ray Vaughan no festival de Montreux. O primeiro, de 1982, revela o guitarrista em início de carreira, a dar tudo o que tinha, mas sem conseguir conquistar a simpatia do público, à excepção de duas pessoas especiais que naquele dia se encontravam na audiência, David Bowie e Jackson Browne, que iriam ajudar a revelar ao mundo um dos grandes instrumentistas da história dos blues. O segundo, realizado três anos depois, apresenta Vaughan como um nome consagrado mas nem por isso menos empenhado em incendiar a plateia com os seus solos estonteantes. Com matéria-prima desta, não tenho qualquer dúvida de que não haverá bailarico ou fogo de artifício que consiga, hoje, competir com o meu serão. Só posso recear é vir a ser acusado de concorrência desleal.

30 dezembro 2006

Bach, mestre do hard-bop

Neste final de ano, a música do Classical Jazz Quartet caiu-me em graça. De alguma forma, foi uma maneira de compensar o facto de, ao longo dos anos mais recentes, ter concedido poucas horas de audição à música clássica, em favor de outras opções. Neste Play Bach, os atributos do quarteto presentes no álbum em que é Tchaikovsky a fonte de inspiração podem ser aqui encontrados, também em plena força. Kenny Barron e Stefon Harris fazem uma dupla de solistas entusiasmante, enquanto Ron Carter e Lewis Nash mantêm o fogo rítmico bem aceso, o que chega para fazer bater o pé ao som de algumas das peças mais famosas de J.S. Bach. Seria um pouco bizarro, se este quarteto não fosse simplesmente estupendo, ao ponto de ter argumentos quase suficientes para nos convencer que Bach estava a pensar no hard-bop quando decidiu ser compositor. Para um destes dias, aguardo a oportunidade de espreitar o que fez o The Classical Jazz Quartet com a música de Rachmaninov. Com estes cartões de visita, a expectativa é alta.

29 dezembro 2006

Mais truques de Derek Trucks

Um dos presentes que o bom do Pai Natal me trouxe este ano, vinda de Londres onde as lojas de discos são dignas desse nome, foi a nova edição da Derek Trucks Band. O álbum chama-se Songlines e apresenta algumas novidades em relação à discografia anterior. Por um lado, a presença de um vocalista, com uma boa escola de blues e soul, que assenta como uma luva sobre a música da banda. Depois, o interesse de Derek Trucks por sonoridades de tradição oriental, que lhe valem alguns dos melhores momentos do disco e, claro, alguns dos melhores solos de guitarra que se podem escutar neste CD. Tanto quanto me apercebo, encontrar os discos da Derek Trucks Band em Portugal continua a ser uma tarefa frustrante. É uma pena, porque o som blues-rock, muito seventies, que esta gente produz sob a liderança de um guitarrista impecável, merecia mais atenção por cá. Enfim, pela minha parte cá vou aproveitando o privilégio de ter dois discos da Derek Trucks Band. Isto enquanto uma gravação ao vivo, já encomendada, não me chega às mãos. Vinda de fora, obviamente.

28 dezembro 2006

Alhos e bugalhos, II

Está longe de ser uma novidade a interpretação, por nomes do jazz, de temas da música clássica, em sentido lato. O pianista Jacques Loussier é um dos exemplos, numa carreira em que tem dedicado particular interesse na obra de J.S. Bach. Isto para não mencionar aqueles pianistas, e não só, que, tendo recebido uma formação clássica, enveredaram posteriormente pelo jazz, mas sem deixar de fazer transparecer através da sua música as raízes da sua aprendizagem. Dave Brubeck é um caso exemplar e, numa esfera mais próxima, é essa também a situação de Bernardo Sassetti. Isto apenas para recordar que as gravações do Classical Jazz Quartet não têm nada de revolucionário. Mas o que esta banda possui, e em doses generosas, é uma assinalável capacidade para pegar em temas célebres de grandes compositores, virando-os do avesso e injectando-lhes uma energia contagiante. Outra coisa também não seria de esperar de um agrupamento que reúne veteranos como Kenny Barron (piano) e Ron Carter (contrabaixo) e gente mais nova, mas de alta qualidade, como Lewis Nash (bateria) e Stefon Harris (vibrafone). Este Play Tchaikovsky, que ando agora a escutar, deixaria o compositor russo abismado e por (muito) bons motivos.

27 dezembro 2006

Alhos e bugalhos

A editora holandesa Koncurrent tem desafiado diversas bandas a gravarem em parceria. Os nomes são escolhidos de acordo com um critério curioso. Não é necessário que a música praticada por cada uma das bandas seja semelhante ou apresente, sequer, quaisquer pontos de contacto aparentes, mas apenas que os seus elementos admirem o trabalho da contraparte e, naturalmente, estejam dispostos a assumir o desafio de juntar talentos em estúdio e deixar um testemunho para a posteridade. No caso do EP, In The Fishtank, gravado pelos Willard Grant Conspiracy e pelos Telefunk, a iniciativa revelou-se muito produtiva. De um lado, o folk e o country dos Conspiracy; do outro, a electrónica dos Telefunk. Tudo junto e bem misturado, em redor de seis temas tradicionais, e eis um disco curto mas verdadeiramente fora de série. O que mais bem pode ilustrar este qualificativo é Cuckoo, onde se reúne, de forma surpreendentemente original e harmoniosa, o melhor que uma e outra banda fornecem para o sucesso desta feliz associação.

25 dezembro 2006

A arte do post-bop

Há outros aspectos agradáveis no Natal, mas receber presentes de que se gosta muito, parecendo coisa demasiado materialista, interesseira e contrastante com o espírito da época, não deixa de ser um dos pontos fortes do evento. Hoje, alguns presentes simpáticos vieram alargar o leque de discos de que disponho. Sobre eles escreverei durante as próximas semanas mas, para começar a ronda, assinalo Critical Mass, do Dave Holland Quintet, o mais recente fruto deste projecto liderado por um dos grandes contrabaixistas de sempre. Sou um incondicional do trabalho que esta banda tem vindo a fazer nos últimos anos e que se pode avaliar em álbuns como Prime Directive, Points of View ou Not For Nothin'. Critical Mass, a mais recente edição do Dave Holland Quintet, segue os mesmos padrões. Chris Potter e Robin Eubanks semeiam o êxtase com os seus solos e colocam o saxofone e o trombone em diálogos e despiques de derreter quaisquer resistências. Steve Nelson continua a deslumbrar com o seu bom gosto e destreza no vibrafone, enquanto Holland se mantém num pico de forma, o que se traduz no poderoso sustento rítmico que vai fazendo sair das produndezas do contrabaixo. Novidade, e boa, é a do baterista Nathe Smith que veio preencher a vaga deixada pela saída de Billy Kilson da banda, cumprindo, e muito bem, a exigente função. Aqui está, uma vez mais, post-bop de encher as medidas, num disco de uma banda coesa e na qual impera a liberdade para improvisar.

24 dezembro 2006

Ver e escutar a música de Sassetti, II

Há espectáculos que, depois do cair do pano, nos deixam uma sensação de bem-estar, quase de euforia, pela superior qualidade do que se passou em cima do palco. Ontem à noite, numa casa cheia, assisti à apresentação do novo disco de Bernardo Sassetti, Unreal: Sidewalk Cartoon, no Teatro de São Luiz, em Lisboa. Já aqui tinha referido que a música do disco me agradou, mas que faltava uma peça do puzzle para que pudesse apreender todo o sentido da obra. Ontem, tive finalmente a oportunidade de ver e ouvir tudo o que Sassetti imaginou e planeou quando se lançou, na companhia dos Drumming, neste projecto. E tão cedo não esquecerei aquilo que testemunhei. Bernardo Sassetti é um pianista de excepção, já se sabia. Mas é, também, alguém capaz de, através da imagem e da palavra, criar algo que vai muito para além da música, como já se tinha percebido quando do lançamento de Ascent. Desta vez, uma ficção nonsense e condimentada com muito bom humor foi vertida para uma peça de animação, complementando o trabalho dos músicos que teve no grupo de percussão que se apresentou em palco com Sassetti, um dos seus aspectos mais notáveis. Dizer que se tratou de um espectáculo fabuloso é capaz de ser pouco.

23 dezembro 2006

Não há coincidências?

A primeira observação a fazer a respeito do disco que justifica este post é a de que Taj Mahal é um nome, no mínimo, curioso para um intérprete de blues. A sua biografia refere que a ideia de adoptar a designação de um dos mais célebres monumentos do mundo lhe surgiu num sonho. Não terá sido o primeiro, nem o último músico a recorrer a esta táctica para encontrar um nome invulgar e fácil de decorar, pelo seu carácter inesperado. Mas adiante. The Natch'l Blues é uma das primeiras gravações que Mahal liderou, no final dos anos 60, e que lhe valeram a fama de ter recuperado as tradições dos blues acústicos, apesar de os instrumentos eléctricos também se escutarem por aqui. É o terceiro disco de uma trilogia cujos temas permanecem bem frescos tantos anos depois da sua aparição. Na versão remasterizada que actualmente se pode encontrar no mercado, a qualidade do som é óptima e ainda há o direito a aceder a três canções extra, sendo uma delas uma versão alternativa de The Cuckoo e as restantes, tanto quanto sei, inéditos que estiveram adormecidos nos arquivos. O mais estranho é que hoje, quando decidi escrever sobre The Natch'l Blues, estava longe de imaginar que a versão original, em vinil, foi lançada a 23 de Dezembro de 1968, faz hoje precisamente 38 anos. Ainda dizem que não há coincidências.

22 dezembro 2006

Os olhos e os ouvidos

Tal como sucede na gastronomia, também os discos podem começar por ser apreciados através da vista. As edições de Rabih Abou-Kahlil sob a etiqueta Enja são paradigmáticas. A generalidade das capas dos CD apresentam um trabalho gráfico impecável e pegar num exemplar apenas para apreciar melhor o que a visão alcança já é dar seguimento a um impulso a que não vale a pena dar luta. Há outros casos, mas The Cactus of Knowledge é, talvez, o que mais bem ilustra a situação. Além dos desenhos de inspiração árabe que compõem a capa, há ainda a assinalar um pequeno livro com excelentes fotografias de estúdio dos músicos que tocam no álbum. Tudo isto rematado com uma impressão e acabamentos de luxo, com o objectivo, conseguido, de tentar o coleccionador. De pouco valeria tanto investimento se o principal, a música, não estivesse à altura do respestivo embrulho. Acontece que este é um dos grandes discos do executante de oud, de origem libanesa, que tem ocupado uma boa parte da carreira a tocar na companhia de nomes relevantes do jazz, como Tom Varner (trompa) ou Antonio Hart (saxofone alto) que figuram entre os 12 elementos que participaram nas gravações de The Cactus of Knowledge. Há muito de bom com que entreter os ouvidos entre as oito faixas deste disco. Pelo título bem achado e pelo trabalho da banda, fica aqui o destaque de Ma Muse M'amuse. E o conselho de que se escute o resto, enquanto se desfruta o que a capa tem para oferecer.

21 dezembro 2006

Uma hora bem passada

John Scofield tem deambulado nos últimos anos entre o jazz mais tradicional, o post-bop, a fusão e o funky. É um daqueles músicos que se mostra à vontade em todos estes terrenos e, mais importante, tem mantido um padrão de qualidade elevado a que também não é estranho o critério com que selecciona os companheiros que colaboram nas suas gravações. Hand Jive, disco de 1994, é uma das obras a que retorno com alguma frequência, de cada vez que me apetece escutar o som metálico, a caminho do rock, que se tornou no cartão de visita do guitarrista. Neste álbum, o estilo dominante é o funky, servido pelo pianista e organista Larry Goldings, um dos mestres neste ofício, e pelo saxofonista Eddie Harris. A juntar a este trio, Hand Jive conta ainda com o contrabaixista Dennis Irwin, o percussionista Don Alias e o baterista Bill Stewart, um dos actuais nomes de referência nesta disciplina. Em dez temas da autoria de Scofield, esgota-se uma hora de música que faz mexer. Dois bons exemplos? I'll Take Les e Do Like Eddie.

20 dezembro 2006

Uma mistura improvável

Imagine-se o cruzamento entre uma banda da pop mais pueril dos anos 60 com outra talhada a golpes de guitarra e, ainda outra, esculpida no mais sombrio e duro psicadelismo da mesma década. Uma mistura entre Beach Boys, The Who e os Pink Floyd de Syd Barrett. Parece estranho, mas há um álbum que soa desta forma. Foi lançado em 1987, mas podia ter sido editado 20 anos antes e, provavelmente, ninguém daria por nada. Os autores da façanha dão pelo nome de The Dukes of Stratosphear e, tendo como ocupação principal um outro projecto transbordante de talento mas relativamente ignorado, demoraram algum tempo a reconhecer que, de facto, eram eles os nomes por detrás desta aventura retro. Quem conheça bem os XTC não terá muita dificuldade em desconfiar, ao escutar Chips From the Chocolate Fireball, que já conheceu aquelas vozes em qualquer lado. O álbum é, sobretudo, uma paródia à década dos Beatles, mas nem por isso deixa de estar repleto de boas canções: 25 O’Clock, Bike Ride to the Moon, What in the World?, Vanishing Girl e muitas outras, entre as quais Pale and Precious que o próprio Brian Wilson nem teria desdenhado. Incluindo os arranjos e as harmonias vocais…

19 dezembro 2006

O encanto de Joni Mitchell

Os álbuns de Joni Mitchell são daqueles que têm de ser escutados uma boa dúzia de vezes antes de se deixarem conquistar. As canções são sofisticadas e fogem dos padrões de cada uma das referências que marcam o seu trabalho. Não são facilmente enquadráveis no jazz, na pop ou no folk. Mitchell lança desafios a quem a escuta e, acompanhando a sua discografia, é possível encontrar o género de viragens próprias de quem se foi preocupando em experimentar ideias novas, escavando a inspiração em lugares que não pareciam ser os seus. Court and Spark, só por si, dá conta deste percurso que a transformou numa figura influente, mas inimitável. É o disco de Joni Mitchell que mais vendeu e até produziu três êxitos, devidamente assinalados na capa da versão em CD que tenho em meu poder. E, no entanto, há que escutá-lo com a devida atenção porque está longe de ser um disco susceptível de ser carimbado à pressa como "comercial". Tal como na restante obra de Mitchell, está carregado de subtilezas, a começar pelas melodias que acabam por levar quem o ouve por caminhos inesperados. É este um dos principais encantos na música de Joni Mitchell.

18 dezembro 2006

No princípio foi assim

Antes de começar a trilhar uma carreira a solo que, a partir de Debut, lhe granjeou elogios e um justíssimo lugar entre o que de mais notável se fez no universo da pop electrónica desde os anos 90 até hoje, Björk Guõmundsdóttir (acho que é assim que se escreve) passou uns tempos a divertir-se à grande. Pelo menos, é o que se pode perceber a partir da música de Gling-Gló, disco gravado após a realização de algumas prestações ao vivo efectuadas pela ex-líder dos Sugarcubes com o trio de jazz islandês liderado pelo pianista Guõmundur Ingólfsson (também acho que é assim que se escreve). O álbum foi, durante algum tempo, uma quase raridade, difícil de encontrar em solo português e, em terras estrangeiras, apenas resgatável através de uma soma ligeiramente exorbitante em comparação com os preços normais de um CD. Björk é um poço de criatividade e emotividade e Gling-Gló é a oportunidade para, através de temas de jazz e da tradição islandesa, conhecer uma faceta diferente daquela que é mais conhecida na obra da cantora. A voz inquieta e a entrega inconfundíveis de Björk andam por aqui, como seria expectável, e o trio que a acompanha executa o seu trabalho com assinalável competência. E tudo isto faz com que Gling-Gló seja muito mais do que uma mera curiosidade.

17 dezembro 2006

Um trombone nunca seria suficiente

Não se pode dizer que, para quem começou a tocar violino e trombone durante a infância e guitarra a partir dos 11 anos, Leo Kottke tenha sido beneficiado pelo destino. Perdeu uma parte da audição no ouvido esquerdo devido a um acidente com algo parecido com uma bombinha de Carnaval e, mais tarde, sofreu uma lesão irreversível no ouvido direito durante um exercício com fogo real enquanto cumpria o serviço militar. Ainda assim, Kottke não desistiu. Após ter abandonado o trombone porque, segundo as suas palavras, era um instrumento em que só podia tocar uma nota de cada vez, percorreu os Estados Unidos com a sua guitarra, transformando-se num músico itinerante, até ser descoberto e contratado para começar a deixar registados para a posteridade os seus talentos. O álbum 6 And 12 String Guitar é um dos eloquentes testemunhos do seu virtuosismo. Inteiramente instrumental, percorre os blues, a folk, a country e até passa pelo período barroco, através de um tema de J.S. Bach, o único que em todo o disco não é da sua lavra. Em suma: um trombone nunca seria, de facto, o meio adequado para quem tem tanta nota para dar. O que seria, por exemplo, de Vaseline Machine Gun? Ou de Busted Bycicle? Ou de The Driving of the Year Nail?

16 dezembro 2006

Eu ontem (não) adormeci assim

Há discos em que Van Morrison passa em revista os estilos a que se tem dedicado desde que, nos idos de 60, começou a construir uma carreira invulgarmente sólida e produtiva. Quando damos por ela, Morrison já lançou mais um álbum, o que, quase sempre, é uma novidade para acolher com agrado, dada a regularidade das suas obras no que toca à qualidade. Magic Time, de 2005 e que já conheceu sucessor em Pay The Devil, editado este ano, é um dos casos em que, de tema em tema, o antigo líder dos Them salta dos blues para a celtic-soul e daqui para o jazz e a folk. No alinhamento do disco, há três canções que reúnem a minha preferência e que são objecto de audições sucessivas. A saber: Keep Mediocrity at Bay, os blues uptempo de Evening Train, e o alegre swing de This Love of Mine. Incluem solos de harmónica, guitarra e saxofone, além de atraentes arranjos para metais, e vão direitinhas àquela zona do cérebro que gere o stock de adrenalina. Com temas como estes, não há maneira de conseguir adormecer.

15 dezembro 2006

Os Byrds e um dilema

Quando me apetece ouvir um disco dos Byrds, difícil é escolher entre a mais de meia dúzia de álbuns marcantes que a banda fez nos anos 60. Desde a estreia, com Mr. Tambourine Man, a Ballad of Easy Rider, os Byrds foram semeando a sua influência à medida que absorviam o que lhes ia chegando de fora. Começaram pelo folk, passaram pelo psicadelismo e, finalmente, contribuíram para criar as fundações do country-rock naquela que, na minha opinião, é uma das fases menos interessantes do seu percurso mas, ainda assim, muito longe de poder ser considerada medíocre. As harmonias vocais e a guitarra eléctrica Rickenbaker de 12 cordas que Roger McGuinn ajudou a popularizar fazem parte da personalidade vincada dos Byrds. Em cada um dos discos que gravaram na sua década dourada, há pelo menos uma canção que eu não dispensaria como bagagem para uma hipotética ilha deserta. Em The Notorious Byrd Brothers, editado no auge da onda psicadélica que varreu o rock, em 1968, o tema eleito é Draft Morning. Mas, se houvesse espaço nas malas, ainda lhe acrescentaria Tribal Gathering, em que David Crosby assegura a voz principal. A boa notícia é que não há nada no horizonte que me diga que, um dia, terei de fazer opções complicadas como estas.

14 dezembro 2006

O incontornável Nick Drake

Não faltam na história da música, popular ou erudita, exemplos de como na espuma dos dias se podem cometer graves injustiças. Nick Drake é um dos mais eloquentes. A sua curta carreira, materializada na gravação de três álbuns, revelou um cantautor de excepção mas - trágica ironia - foi a sua morte prematura que serviu de ignição a uma onda de culto que o elevou ao estatuto de referência de que goza hoje em dia e que vai muito para além das fronteiras do folk a que se dedicou em vida. Brad Mehldau, um dos expoentes máximos do jazz actual, é um dos músicos que tem recorrido, com grande regularidade, às canções de Drake. A solo ou em trio, são vários os álbuns do pianista que incluem improvisos desenvolvidos a partir de temas do malogrado trovador. Five Leaves Left foi o primeiro álbum lançado por Nick Drake, data de 1969, e é uma das três escassas, mas brilhantes, preciosidades que integram a sua discografia. É uma daquelas obras que devem ser acarinhadas com a frequência que os discos muito especiais merecem. Foi a tarefa a que me dediquei ontem, deixando-me embalar por temas como Time Has Told Me, River Man, Three Hours, The Thoughts of Mary Jane ou Man in a Shed, já para não citar o álbum todo que é o que na verdade seria justo e razoável fazer.

13 dezembro 2006

Um brinde para Ian Anderson

Há bandas que, quando tentam fazer diferente daquilo que sabem fazer melhor, começam a meter água. Diluem a sua personalidade na tentativa de se mostrarem abertas aos novos ventos e perdem a sua identidade. Foi o que se passou com Ian Anderson e os Jethro Tull. Na viragem dos anos 70 para a década seguinte, não souberam acomodar a queda em desgraça do rock progressivo, de que foram um dos projectos mais originais, e arrastaram-se anos a fio, sem honra nem glória, numa sucessão de álbuns pouco mais do que desinteressantes. Até que, em 2000, Anderson se enfiou em estúdio com um pequeno grupo de músicos e gravou as canções que integram The Secret Language of Birds. Além da qualidade dos temas, ao nível do melhor que Ian Anderson fez com os seus companheiros dos Jethro Tull, o disco tem a vantagem de ser quase totalmente preenchido com instrumentos acústicos, com relevo para as guitarras, bandolim e flauta em que o próprio Anderson é um exímio executante. Um brinde para o líder dos Jethro Tull que, em The Secret Language of Birds, regressou ao caminho que um dia, em hora de pouco acerto, decidiu abandonar.

12 dezembro 2006

A varinha de Condon

Zach Condon é um nome estranho mas é daqueles que vale a pena decorar. Trata-se de um teenager oriundo de Albuquerque e que vive actualmente em Brooklyn, Nova Iorque. Passou parte da adolescência a gravar canções em casa, inspirado por bandas como os Magnetic Fields. E depois de, ao que consta, ter viajado pela Europa quando somava apenas 16 anos, decidiu registar uma série de temas inspirados no folk balcânico e na música cigana. Estas canções estão agora disponíveis em CD, num álbum intitulado Gulag Orkestar e assinado por uma banda chamada Beirut, liderada, obviamente, por Condon, que assegura boa parte dos instrumentos que são tocados ao longo do disco. E isto inclui coisas tão diversas como trompete, bandolim, acordeão e, até, cavaquinho que, na ficha técnica que acompanha o CD, assume a designação de ukelele que lhe é dada no Pacífico. O mínimo que posso dizer é que Gulag Orkestar é uma das grandes surpresas com que me deparei nos tempos mais recentes. E mais não consigo escrever porque ainda estou enfeitiçado pela varinha de Condon, a não ser que recomendo a audição. Suspeito, também, que os Beirut, ou Zach Condon, ainda vão dar muito que falar.

11 dezembro 2006

Para fãs de guitarra e não só

Quando escutou a performance de Stanley Jordan durante o concerto que, em 1985, comemorou o renascimento da etiqueta Blue Note, o saxofonista Dexter Gordon limitou-se a perguntar quem era o contrabaixista. O humor fleumático de Gordon ilustra bem o espanto provocado pelo guitarrista junto de quem contacte, pela primeira vez, com a sua impressionante destreza. Na prestação em causa, Jordan apresenta-se só em palco, mas a sua técnica de tapping, arrancando notas e acordes da guitarra como se na realidade estivesse a tocar piano, até chega a fazer duvidar de que seja possível um homem apenas fazer tanto, recorrendo somente àquele instrumento. Em Live in New York, o cenário é diferente. Stanley Jordan actua em quinteto. Mas são os seus solos que lideram a banda numa série de temas em que se incluem clássicos de John Coltrane, outro mestre no campeonato destinado a avaliar quem consegue tocar mais notas por segundo. O desempenho de Jordan é bem secundado pelo do pianista Kenny Kirkland, com quem o guitarrista divide, desta vez, os louros pela boa música produzida. Live in New York é um grande álbum para fãs de guitarra, mas não só. Tem swing que se farta.

10 dezembro 2006

Ver e escutar a música de Sassetti

Bernardo Sassetti contou, numa entrevista ao , suplemento do DN, que o projecto para o seu novo álbum, Unreal: Sidewalk Cartoon, partiu do convite que lhe foi dirigido pelo agrupamento de percussão Drumming (GP) para que compusesse música para a banda interpretar. Com base neste desafio, a relação entre as duas partes desenvolveu-se e o fruto acabou por ser a edição deste novo disco. Uma das facetas interessantes de Sassetti está no facto de gostar de explorar novos terrenos, ao mesmo tempo que recusa estabelecer fronteiras para a música que faz. Na mesma conversa, revelou a sua indiferença sobre a questão de saber se aquilo que se pode escutar em Unreal é ou não jazz. Ainda bem, porque aquilo de que a música mais precisa é de espíritos livres como o de Bernardo Sassetti. Unreal surge na sequência de Ascent e Alice, completando uma trilogia na obra do pianista em que música e imagem se enlaçam. É um disco muito diferente dos anteriores, logo à partida pelo facto de os seus alicerces estarem na percussão, a partir da qual parece que tudo o resto é construído. Outra sensação que a sua audição transmite, é a de que, dos três álbuns em causa, é o mais "cinematográfico" e, por isso, aquele que menos dispensa a visualização das imagens e da ficção que lhe estão associadas. Não quero com isto dizer que a música em Unreal não tem suficiente poder de sugestão para que quem a escute não possa dar por si a imaginar situações. Mas funciona, acima de tudo, como um poderoso incentivo para ver a apresentação do projecto com tudo o que para ele foi planeado. Sem imagem, falta algo de essencial para compreender a música de Unreal. É como escutar uma ópera sem nunca a ter visto.

09 dezembro 2006

Com um "C" grande

Começo por revelar que as vozes femininas recentes que se movimentam na área do jazz, ou próximo dela, têm sido objecto de algum desprezo da minha parte. Por algum motivo, a avalanche de nomes que têm chegado ao mercado nem sempre têm suscitado o meu interesse. Tenho até sentido algum enjoo perante a banalidade de algumas propostas que, no entanto, gozam de enorme sucesso. É o caso de - sacrilégio! - Norah Jones. Não lhe acho graça nenhuma, do ponto de vista musical. No extremo oposto, no entanto, coloco Madeleine Peyroux. Esta, sim, é uma voz irresistível, emotiva, talhada com cuidado e dedicação, moldada com uma paixão que faz lembrar grandes figuras como Billie Holiday, a diva que não deixa de vir à recordação enquanto se escuta Peyroux. Half the Perfect World, o seu novo disco, é uma obra delicada, cantada com ternura e traz Madeleine Peyroux de regresso, como sempre, mais voltada para os blues do que para o jazz. Quem anda à Norah que me desculpe, mas se quiserem fazer comparações, eu acho que Madeleine Peyroux é que é uma cantora com "C" grande.

08 dezembro 2006

Se o tempo voltasse para trás

Li alguns elogios ao novo disco dos The Who, agora reduzidos a Roger Daltrey e a Pete Townshend no que se refere a elementos da formação original, depois das mortes de Keith Moon e de John Entwistle. No essencial, era louvado o regresso da banda ao som que a caracterizou em álbuns como Who's Next e Quadrophenia. A expectativa era, por isso, a de reencontrar os poderosos riffs de Townshend na guitarra, sobrevoados pela raiva ou pela doçura que, alternadamente, Daltrey sabia colocar na voz. Não se pode dizer que a audição de Endless Wire deixe frustrado quem nela se aventure. Os riffs explosivos continuam a morar aqui. E embora a qualidade das canções perca, em geral, na comparação com aquilo que os The Who fizeram nos seus melhores tempos, há bons momentos a registar. São os casos de Man in a Purple Dress, a entrada de Mike Post Theme, God Speaks of Marty Robbins e, ainda, alguns dos temas que integram a mini-opera intitulada Wire & Glass que encerra o disco, sendo esta a parcela mais feliz de toda a obra e a que mais justifica o facto de Daltrey e Townshend terem decidido voltar aos estúdios para gravar sob o nome The Who, 24 anos após a edição do anterior álbum de originais da banda. Acontece, porém, que a voz de Daltrey já perdeu uma boa parte do seu potencial e a tentação de auto-plagiar o arranque de Baba O'Rilley logo no início do disco, no tema Fragments, deixam uma vaga sensação de mal-estar. Em resumo: aquilo que é bom em Endless Wire não envergonha o legado dos The Who para a história do rock. Mas soaria bastante melhor se ainda estivéssemos na primeira metade dos anos 70. Não por uma questão de moda, mas porque o tempo é impedioso para quem pratica o género de música em que os The Who se distinguiram.

07 dezembro 2006

O zeloso funcionário

Andei distraído e só ao segundo álbum travei conhecimento com esta banda. Como se costuma dizer, mais vale tarde do que nunca. E a verdade é que se eu jamais me cruzasse com os Vetiver, a perda seria clamorosa. Agradeço, por isso, ao zeloso funcionário de uma loja de discos que, numa hora de inspiração, colocou o álbum To Find Me Gone num posto de audição suficientemente destacado para que, numa visita apressada, eu me tenha sentido tentado a agarrar nos auscultadores e a dar uma volta pelos temas de folk que por aqui se encontram. O disco anda por aí no topo das listas dos melhores de 2006 e não é caso para admiração. As canções são de primeira água e as guitarras acústicas e a voz de Andy Cabic cativam logo ao primeiro contacto. Tudo junto é suficiente para explicar por que razões To Find Me Gone é um disco que já conquistou um lugar especial nas minhas preferências, algures onde também se podem encontrar nomes como Iron & Wine ou Sufjan Stevens. Com gente deste calibre, o folk terá uma vida longa e sã.

06 dezembro 2006

Eu ontem adormeci assim

Vozes como a de Stina Nordenstam podem encontrar-se com alguma facilidade nos dias que correm, sobretudo quando se vasculham as prateleiras de música alternativa ou electrónica, com queda para o minimalismo. Mas em meados dos anos 90, quando o álbum And She Closed Her Eyes foi editado, não era bem assim. Este disco é o segundo na carreira da cantora sueca e as canções que o integram são na totalidade fruto da sua criatividade. Stina tem uma voz frágil, sussurrada, por vezes infantil e os temas que interpreta desenham ambientes intimistas, funcionando em pleno quando é necessário encontrar o enquadramento favorável a um estado de pausa e recolhimento. Como diz o título, eu ontem adormeci assim, ao som de suaves harmonias vocais.

05 dezembro 2006

Que se lixe a taça

Quando se trata de músicos de jazz portugueses, confesso que tenho uma grande predilecção por Bernardo Sassetti. E isto já me causou alguns dissabores, ainda que ligeiros. No mercado há concorrência de peso e esse facto tem-me sido sempre recordado de cada vez que vem à baila o debate, absolutamente frívolo, de saber qual é o melhor pianista em actividade no país. Como não tenho a pretensão de acumular argumentos para vencer o derby "Mário Laginha versus Sassetti" para a liga do jazz nacional, aquilo que me parece mais sensato é ouvir a música de um e de outro. Desta forma, fico sempre a ganhar. Canções e Fugas, por exemplo, é um grande álbum de piano solo em qualquer parte do mundo e do melhor que Mário Laginha tem produzido, lamentando-se, apenas, que até agora tenha dedicado escasso tempo à edição de álbuns que permitam conhecer melhor as suas faculdades como pianista. Escute-se, pelo menos, Do lado de Cá do Mar, Fuga em Ré Maior, Berenice e Fado, em que a mão esquerda de Laginha faz de viola e a direita pega na guitarra, para se perceber que não estou a exagerar. É caso para dizer: perante tão boa música, que se lixe a taça.

04 dezembro 2006

Homenagem a Billy Preston

Foi através da versão em vinil de The Concert For Bangladesh que conheci nomes como Bob Dylan, Leon Russel, Eric Clapton e Billy Preston. Entre as 15 canções tocadas pela banda liderada por George Harrison, as minhas preferências iam para It Don’t Come Easy, cantada por Ringo Starr, o vigoroso Jumpin’ Jack Flash, por Leon Russel, Awaiting on You All, tema de All Things Must Pass do ex-guitarrista dos Beatles, e o grande momento de soul e gospel do concerto, com o órgão e a voz de Preston em That’s the Way God Planned It. Quando finalmente surgiu a versão deste espectáculo em DVD, não podia deixar de o trazer para casa com o objectivo de preencher os momentos de nostalgia pelo tempo em que a década de 70 dava os primeiros passos. Reforcei a convicção de que a canção de Billy Preston é uma das mais fortes de todo o repertório, circunstância que é sublinhada pelo facto de na exaltante sequência final, o próprio músico não ter resistido a saltar do órgão para improvisar uns passos de dança. Descobri, há alguns dias, que Preston faleceu este ano. Aqui fica uma homenagem.

03 dezembro 2006

Périplo latino

No pequeno texto que se pode ler na capa de La Espada de la Noche, Ted Nash explica que a música contida no disco revela o seu gosto "pela beleza e diversidade das culturas do mundo, em especial a cultura latina". Este interesse do saxofonista tem ficado patente nalguns dos seus trabalhos, sobretudo quando grava com a banda Odeon, que se apresenta com uma formação invulgar. Além dos sopros executados por Nash (saxofones, clarinetes e flauta), o agrupamento inclui a violinista Nathalie Bonin, Clark Gayton (tuba e trombone), Bill Schimmel (acordeão) e o baterista Matt Wilson. Em La Espada de la Noche, Ted Nash recorre ao tango para recriar o clássico A Night in Tunísia, entra pelo Brasil através de Tico Tico e pega em dois andamentos do Concerto de Aranjuez para viajar até à Península Ibérica. Como o próprio saxofonista sublinha, os temas interpretados neste disco percorrem diferentes emoções, desde o humor à tragédia. Hoje, um domingo preguiçoso como qualquer outro, deliciei-me com a audição deste álbum. Principalmente com o virtuosismo de Natalie Bonin e o som açucarado dos clarinetes manuseados por Nash.

02 dezembro 2006

As atmosferas de Carlos Bica

Na abertura deste álbum escuta-se uma caixa de música. O tema chama-se Iceland e, não sei se o caso é mera coincidência ou se foi propositado, mas fez-me lembrar o início de um concerto ao vivo de Björk de que tenho o registo em DVD. Pouco importa, porque se trata de uma oportuna introdução para uma faixa que, de facto, sugere as paisagens daquela ilha, tão inóspitas como carregadas de força. Pelo menos é assim que eu as imagino. Com muita pena minha, nunca lá coloquei os pés. Tudo isto serve para ajudar a dizer que este álbum do contrabaixista Carlos Bica, baptizado com o título Believer, é uma obra hipnotizante e cheia de atmosfera. Bica tem por companhia Jim Black, na bateria, e Frank Möbus, na guitarra eléctrica. A estes, junta-se ainda DJ illvibe, que é responsável por intervenções cirúrgicas e notáveis, de que um dos exemplos pode ser encontrado em P-beat. Believer é uma das óptimas edições de jazz feito em Portugal nos tempos mais recentes e resta assinalar que vale a pena ser escutado com concentração. É que, além de tudo o mais, a música está muito bem gravada, como demonstra a sonoridade natural com que a bateria salta das colunas.

01 dezembro 2006

Os detalhes de Judee Sill

O nome Judee Sill é daqueles que não desperta qualquer reacção no comum dos mortais, a não ser, talvez, estranheza. Sill é uma daquelas cantautoras dos anos 70 que mereceu elogios quando da edição dos dois únicos álbuns que gravou, mas que não conseguiu obter sucesso comercial que expressasse um nível semelhante de reconhecimento da parte de audiências mais alargadas. Não foi caso único. Antes de entrar pela primeira vez num estúdio de gravação, tinha já escapado às garras da heroína. Depois de ter editado o seu segundo disco, Heart Food, deixou-se apanhar novamente nas malhas apertadas da toxicodependência que havia de lhe tirar a vida quando aquela década se aproximava do fim. Carole King e Joni Mitchell são os dois pontos de referência habitualmente apontados quando se trata de tentar situar a música de Judee Sill. A curta obra que legou não tem nada de particularmente inovador, nem essa seria a intenção, mas nos terrenos da folk-pop semeou uma mão cheia de canções cuidadas ao detalhe. Rezam as crónicas que Sill podia consumir um ano inteiro antes de dar por terminada uma composição. De Heart Food, destacam-se There's a Rugged Road, Down Where the Valleys are Low, The Phoenix e When the Bridegroom Comes.